“Não deve o espiritismo fechar as portas a nenhum progresso, sob pena de suicidar-se”.

Allan Kardec – Obras Póstumas.

O segmento brasileiro ligado à Confederação Espírita Pan-Americana – CEPA – viveu um momento dos mais significativos de sua história, ao início deste mês. A realização do III Encontro Nacional da CEPABrasil, promovido pela Associação Brasileira de Delegados e Amigos da Confederação Espírita Pan-Americana e organizado pela ASSEPE, em João Pessoa/PB, ratificou e fortaleceu seu caráter manifestamente progressista.

Progresso significa renovação de ideias e atitudes. Renovação, no campo do conhecimento e da ação, leva, necessariamente, ao compromisso com a atualização. Desde a realização do XVIII Congresso Espírita Pan-Americano, em Porto Alegre, no ano 2.000, a CEPA trabalha, objetiva e claramente, uma proposta de atualização do espiritismo.



Faze-o em Congressos abertos, inclusive à efetiva contribuição de outros setores do movimento, e, também, em eventos regionais dos grupos e organismos que a compõem. Embora isso incomode os segmentos mais conservadores do movimento, atualizar também significa assumir uma postura crítica sobre ideias e atitudes até aqui coletivamente construídas e praticadas no próprio seio do movimento. Ou seja: atualizar implica debruçar-se sobre o próprio pensamento, abrindo janelas que o arejem, revitalizem-no e o impeçam de se fechar em si mesmo.

Diferentemente das religiões, que se dizem revelações da divindade, o espiritismo é uma construção genuinamente humana. Resultado direto e progressivo da interlocução entre o que Allan Kardec classificou como a “humanidade encarnada” e a “humanidade desencarnada”, o espiritismo admite a pluralidade das fontes de atualização. Sua filosofia parte da ideia central da sobrevivência do espírito, sua imortalidade, comunicabilidade e evolução. A partir desses princípios básicos, o espiritismo promove – ou deve promover – o diálogo com todas as áreas do conhecimento e se enriquece com ele. Supor que a atualização do espiritismo deva ser feita, exclusivamente, por aquilo que, nos centros espíritas, ditarem espíritos tidos por seus sistemas institucionais como “superiores” será pensar pequeno, reduzindo-o a uma seita.

O evento que a CEPABrasil e a ASSEPE realizaram em João Pessoa teve como meta contemplar o importante universo das chamadas “questões sociais” numa perspectiva imortalista, reencarnacionista e evolucionista: espírita, pois. Ainda que ricamente contemplado n’O Livro dos Espíritos, em capítulos como os da Lei do Trabalho, Lei de Sociedade, Lei de Igualdade e Lei do Progresso, o tema restou um tanto esmaecido no meio espírita. As práticas cristãs historicamente referendadas como exercícios de “caridade”, herdadas pelo movimento aqui autodenominado “espiritismo cristão e evangélico”, distanciaram-se de políticas mais modernas de efetiva promoção humana e construção da cidadania. E, no entanto, estas são movimentos indubitavelmente progressistas da humanidade.

As ciências sociais têm muito a oferecer ao espiritismo. Já o espiritismo, por sua filosofia, pode iluminá-las, conferindo ao fenômeno da vida social um novo sentido e uma ampliada dimensão. O intercâmbio do espiritismo com a ciência social e o efetivo engajamento dos espíritas na práxis social a ambos qualifica. Aponta, ademais, para o rumo da atualização, caminho que, se não trilhado pelo espiritismo, implicará em seu progressivo desprestígio, quando não no próprio suicídio, como alertou Allan Kardec.

*Advogado e jornalista. Ex-presidente da CEPA. Atual presidente do Centro Cultural Espírita de Porto Alegre.

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